arte no tempo : blog

A Associação Arte no Tempo tem por objectivo a divulgação da arte musical contemporânea através da promoção de eventos culturais, do incentivo à criação e à interpretação, da edição e da realização de actividades performativas.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Adriana Mater


“Tempo: o presente. Espaço: um país em guerra.” É nestas circunstâncias que se desenrola Adriana Mater, a segunda ópera da finlandesa Kaija Saariaho, com libretto de Amin Maalouf (que assina também o libretto da sua primeira ópera, L’amour de loin). Decorridos dois anos desde a sua estreia absoluta em Paris, a ópera teve a sua estreia britânica no passado dia 24 de Abril, no Barbican Hall, pela Orquestra Sinfónica da BBC (BBCSO) e os BBC Singers, sob a direcção de Edward Gardner e com Monica Groop (no papel de Adriana), Solveig Kringelborn e Gordon Gietz (elementos comuns à encenação Parisiense) e Jyrki Korhonen.
A BBCSO tem já alguma história na interpretação de música contemporânea e é, de facto, notório o à vontade que a orquestra tem com esse repertório. E foi o que transpareceu na passada semana – a orquestra esteve absolutamente perfeita na interpretação da densa partitura de Saariaho e tudo pareceu fluir com muita naturalidade. Também as vozes (tanto os solistas como os BBC Singers) estiveram ao mais alto nível, com uns solistas muito capazes musical e dramaticamente. O coro, discreto mas eficiente, é utilizado com alguma “reserva”, apenas como uma espécie de amplificação e continuação das vozes dos solistas, para além da amplificação e reverberação propriamente ditas, que Saariaho utiliza sobretudo nos momentos em que a estória nos transporta para o mundo dos sonhos.
A ópera tem vários elementos característicos do estilo da compositora, mas trata-se, como a própria refere, de um ponto de síntese das suas experiências musicais passadas, sendo uma obra mais “escura” e dramática. A escrita de Saairaho é fascinante e esta ópera é, de facto, uma experiência intensa, sobretudo porque à excelente música se aliaram, neste caso, excelentes músicos. Resta aguardar que a ópera seja estreada em Portugal, o que ainda não parece estar previsto. Para já, teremos Saariaho na Casa da Música, em Setembro, com a ONP a interpretar Verblendungen (para Orquestra e Fita) e, em Novembro, com a estreia de Leino Songs (para Soprano e Orquestra) pela Orquestra Sinfónica da Rádio Finlandesa.

D.P.S.

Worten


Recebi, de um amigo, um ditado alemão que muito me agradou:
Es gibt kein Gutes außer man tut es.
Algo que, diz ele, se poderia traduzir como:
Não existe o bom, a não ser o que se faz.
Obrigada, J.M.P..
D.F.

domingo, 27 de abril de 2008

A revolução Peter Rundel


Depois de ter assistido a uma ...manifestação artística e a dois concertos de "Música e Revolução", com algumas decepções e algumas alegrias, destaco a figura de Peter Rundel como músico genial que é.

Comecemos pelo acontecimento da Sala Cyber...
Quando uma manifestação artística é anunciada e associada à sua divulgação surge o nome do Remix Ensemble, não se espera encontrar uma sala repleta de gente a conversar como se de fogo-de-artifício se tratasse. O Poema Sinfónico para 100 metrónomos (1962), de G. Ligeti (1923–2006), foi concebido como um happening, é certo, mas a substância de que é feito não é puramente visual. Da mesma forma que o público se senta para ouvir silenciosamente e aplaudir os músicos de Steve Reich, a citada obra de Ligeti não merece menor atenção, já que proporciona uma experiência singular e que representa, para além do seu próprio significado, uma etapa do pensamento do seu autor, que importa conhecer.
Ora, os músicos do Remix Ensemble que, na Sala Cyber da Casa da Música, na sexta-feira, lá libertaram os metrónomos no seu movimento caótico organizado, não eram propriamente do Remix Ensemble nem sequer músicos.
Os 14 a 22 minutos prometidos - talvez porque os metrónomos do Porto tenham mais corda do que se pensava - acabaram por se estender a uma duração de quase 40 minutos. E como se não bastasse o facto dos próprios elementos da Casa da Música terem dado o mote, conversando mais descontraidamente do que quem visita o Museu de Serralves (logo seguidos pelo restante público, num despreocupado “entra e sai” com conversa circunstancial), duas vezes se fez ouvir, alto e bom som, a chamada para o “evento sério” que decorreria daí a momentos na Sala Suggia.
Alguém terá conseguido prestar atenção (já para não falar de fruição) aos encontros e desencontros dos “ataques” quando já poucos metrónomos se mantêm em movimento? Alguém terá pensado que, se os pretensos músicos se tivessem mantido no local (em vez de o abandonarem em fila, após a “largada” dos pêndulos), o público se manteria atento como se de música se tratasse? ...Mas era ou não era música? E será necessária a presença de músicos no palco para que se ouça? Talvez seja, pelo menos na Casa da Música; talvez por isso lá sejam tão excessivamente escassos os concertos de música electroacústica pura e simples.
O último metrónomo parou mesmo a tempo de transferir para a Sala Suggia o teimoso público que permaneceu até ao fim da peça de Ligeti.

Seguiam-se duas distintas metades de concerto pelos dois agrupamentos residentes e respectivos maestros titulares – talvez seja melhor dizer-se “pelos residentes que mais regularmente trabalham”, uma vez que existe ainda a Orquestra Barroca da Casa da Música, que (infelizmente) não prepara ainda sequer um programa por mês.
A primeira parte foi absolutamente fora de série; dir-se-ia mesmo perfeita, não fosse alguma reserva relativamente à junção do Remix Ensemble com o soprano Marianne Pousseur (filha do compositor belga Henri Pousseur).
Em Zeitmasse foram perfeitos, no contraste, na energia, no som...
Substituíssemos Marianne Pousseur pour Christine Schäfer e a primeira parte do concerto seria digna de pontuação máxima (qualquer que ela fosse).
Naturalmente substituições não estão disponíveis e Marianne Pousseur não deixa de ser uma opção interessante, para Pierrot Lunaire. Um pouco mais de “sprech” e um pouco menos de “gesang”, com “amplificação” natural, talvez fosse a solução. Não podemos deixar de elogiar a interpretação de M. Pousseur, a sua versatilidade tímbrica no movimento entre os diferentes registos que foi criando, de acordo com o texto. Talvez o resultado corresponda ao máximo que pode atingir com o seu aparelho vocal (e, sublinhe-se, não foi nada mau).
O Remix Ensemble provou, uma vez mais, estar à altura dos mais reputados agrupamentos dedicados à música dos séculos XX e XXI.

A segunda parte do concerto trouxe-nos uma obra pouco tocada de um compositor não muito divulgado. François Joseph Gossec (1734-1829), oriundo da Valónia, viveu quase toda a sua vida em Paris, desempenhando um papel activo no meio musical da época: para além dum papel preponderante enquanto inspector na criação do Conservatório de Música de Paris (1795), fundou o Concert des Amateurs (1770), reformulou o Concert Spirituel (1773), no âmbito do qual dirigiu obras suas e de compositores seus contemporâneos, incluindo o Haydn tão “da moda”, na época.
A Sinfonia em Ré maior La Caccia (1763), que König interpretou com a ONP, é uma obra clássica confundível com um Haydn no interior do qual soasse uma instrumentação francesa, evidente no solo de sopros do Minuetto (não muito bem realizado na sexta-feira passada).
Todo o trabalho de König/ONP sobre esta obra exibe um som muito pesado e proveniente dos antípodas da interpretação historicamente informada. No segundo andamento notou-se um certo empastelamento nas cordas, uma afinação (generosamente) reticente e umas trompas “esborrachadas” que acabaram por corrigir na repetição. No terceiro andamento, para além da pouca elegância dos sopros, o aspecto menos positivo foi a insuficiente resposta ao contraste dinâmico exigido por König.
Se a sinfonia de Gossec poderia constituir material novo para a ONP, já o Prélude à l’après-midi d’un faune, de Debussy, não o é e nem por sombras isso se reflectiu na prestação da orquestra. A uma flauta decente mas tímida (a que faltou brilho) seguiu-se uma certa agressividade dos metais. Já a flauta “se abria”, uma linha de um oboé bonito, mais adiante um solo de trompa a recuperar alguma polidez, e a isto se resume um prelúdio raso, sem curva, sem forma.
O naipe de violoncelos sofre da velha desculpa de que os violoncelos são “engolidos” pela acústica da Sala Suggia, o que, mesmo assim, não parece válido para a rusticidade do som com que iniciou o Prelúdio e morte de Isolda, de Wagner. E o que podia ser um final feliz, acabou por ser apenas mais uma pequena decepção, com trompas afinadas mas feias, metais gritantes, vários ataques desencontrados - Liebestod um pouco mais bonito do que o Prelúdio.

Ontem, Sábado, o cenário foi um pouco diferente. Para desconsolo de alguns melómanos, nem A-Ronne recorreu à orquestra, nem os metais da Sagração da Primavera somaram o prazer de abafar um coro de câmara.
A primeira parte do concerto foi protagonizada por um grupo convidado, os Neue Vocalsolisten Stuttgart. ...Inspirava confiança, mas foi um pouco incauto não ter ouvido primeiro a gravação disponível na Wergo (se bem que o pior vê-se, não se ouve).
A-Ronne (de A a Z, em italiano arcaico) é a conhecida obra que parte de um texto de Edoardo Sanguineti, o qual é repetido vinte vezes quase integralmente. O poema, divido em três partes cujos temas são “princípio”, “meio” e “fim”, é construído com citações, em diferentes línguas, das mais diversas fontes, desde a bíblia, Dante, Eliot, Barthes, ou mesmo o Manifesto do Partido Comunista, terminando com as três últimas letras do alfabeto italiano antigo (ette, conne, ronne).
...Mas não é isto o que de mais importante se pode dizer sobre a obra. Se querem saber, ouçam-na e leiam o texto (tem tudo mais a ver com significado e contexto - diferente mas apontando para o mesmo sentido que outras obras para voz/fita de Berio).
A-Ronne, datada de 1974 e inicialmente composta como documentário radiofónico para cinco vozes, presta-se a diferentes cenários. Os Neue Vocalsolisten Stuttgart foram pelo pior, o de uma ridícula comédia que, sinceramente, não lhes ficava bem. Desadequada? Talvez não. ...Mas não teve graça.
Semi-concluindo: a primeira parte do concerto foi algo que, pessoalmente, não me atraíu. Há quem goste, claro. Há quem anua confortavelmente para não fazer feio. Sim, é Berio. E não me incomodaria algum exagero vocal em certas expressões, mas a encenação é um bocado ...para não levar a sério (porque nem sequer tem, de facto, graça).

Na segunda parte voltámos a ouvir a ONP, não com König, mas com Rundel. Também a Sagração da Primavera (1913), de Stravinsky, já tinha sido por ele dirigida na Casa da Música, à frente da ONP.
Em poucas palavras, esperava-se muito mais da orquestra. A leitura que Rundel fez da obra é absolutamente genial, enérgica, plena de garra (sem cavalgarias loucas), onde se joga elegantemente o elemento surpresa (associado a subentendidas nuances dinâmicas e a andamentos que, no contexto, se poderiam esperar ligeiramente mais rápidos ou mais lentos, com resultado sempre mais interessante do que o previsível). A escalas diferentes (do "momento" à "grande forma"), Rundel demonstrou uma concepção empolgante da obra.
A orquestra, porém, mostrou que precisa ainda de mais um considerável período de trabalho para atingir o nível que todos esperamos dela. Não há que atacar dando-a como um caso perdido, porque não o é. Temos é que lhe dar tempo, pois, afinal, os milagres não acontecem (pelo menos em tão poucos meses). Ia comentar naipe a naipe, mas os pontos fracos são mais ou menos comuns: é preciso trabalhar o som (sobretudo os metais, mas também as cordas – todas! – e as madeiras, que apresentam um trabalho muito irregular), a precisão nos ataques ...e pensar com elegância aquilo que lhes é proposto.
Rundel foi a grande surpresa deste fim-de-semana. Ninguém desconfiaria da sua capacidade, mas é superlativa a inteligência sensível com que dirige um genial Pierrot Lunaire numa noite e, na seguinte, com os meios à disposição, algo que vai para além de uma extraordinária maquete do que pretende com a Sagração da Primavera.
...Imagine-se o que faria Rundel com uma das grandes orquestras mundiais...

Tive pena de não ter ido hoje ouvir Gesualdo e Monteverdi. Também gostava de ter visto o que é que Christoph König faria com os músicos de Peter Rundel, na Sinfonia de Câmara nº1, de Schönberg. Mas quando o pequeno "Alves Barbosa" monta a bicicleta...
D. F.

sexta-feira, 25 de abril de 2008

ouvir


"You can’t really get to like any music until you start to listen to it. And once you start to listen to it you may in fact discover that you like it. But the important thing is that liking the music immediately is not the primary issue: the important matter is that your attention should be arrested by the music, that you should be moved by it in some way. Most people, to be honest, who encounter art that is offensive to them, or that makes them feel uncomfortable, will interpret their reaction as one of disliking it. It is the same for music as well. I have always told my students that it is not whether you feel against it or for it that is important, it is the strength of the feeling that is important. I think it is a natural reaction for people to interpret a strong response as a negative response, when in fact it is simply a strong response, which means that whatever it is that has caused the response has been able to do so because it has touched you deeply in certain places, for reasons that you then have to work out for yourself. (...)"
Robin Maconie

"On Karlheinz Stockhausen"

(entrevista conduzida por Eva Radich para o programa "Upbeat" da Rádio New Zealand Concert, difundida em Dezembro de 2007)

quinta-feira, 24 de abril de 2008

25 - 27 de Abril


No próximo fim-de-semana, a Casa da Música apresentará um mini-festival em que decorrerão três concertos que prometem. Trata-se de concertos em que a primeira e a segunda partes são realizada por músicos diferentes, com programas mesmo muito interessantes.
Orquestra Nacional do Porto, Remix Ensemble, Neue Vocalsolisten Stuttgart e Marianne Pousseur interpretarão obras de Schönberg (Pierrot Lunaire e Sinfonia de Câmara Nº 1), Berio (A-Ronne e duas Sequenze), Stravinski (Sagração da Primavera), Debussy (Prélude à l'après midi d'un faune), Stockhausen (Zeitmasse), Wagner (Prelúdio e Morte de Isolda) Monteverdi, Gesualdo e Schutz. Durante meia-dúzia de dias poder-se-á ainda ouvir o Poema Sinfónico para 100 metrónomos, de Ligeti.

No Algarve, é já amanhã que se inicia o FIMA (Festival Internacional de Música do Algarve), por onde passarão, entre outros, Ivan Monighetti e a Cappella della Pietá dei Turchini.

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Falar da Vida


O Centro de Investigação e Estudos de Sociologia - ISCTE promove um curso de verão que decorrerá em Julho e Setembro.

«FALAR DA VIDA»
(AUTO)BIOGRAFIAS, HISTÓRIAS DE VIDA E VIDAS DE ARTISTAS
por Idalina Conde

inscrições até 15 de Maio

Jovens Criadores '08


Recebemos um pedido de divulgação do Concurso Jovens Criadores.


Para mais informações:
Clube Português de Artes e Ideias
Largo Rafael Bordalo Pinheiro nº 29, 2º
1200-369 Lisboa
Tel: 213230090/1 Fax: 213230092
e-mail: jovenscriadores@mail.telepac.pt

domingo, 13 de abril de 2008

um regresso


"Harnoncourt claims that our musical life is in a disastrous state, because we do not truly understand the music we play in our many opera houses and concert halls. The most remarkable aspect of this situation is that we are completely unaware of it."
Lawson, Collin e Stowell, Robin, in The Historical Performance of Music - an introduction


...e agora vou ouvir a Maria João Pires.
Até breve!

D. F.